Sem melindres

Ser melindroso (facilidade de se ofender) é uma clara manifestação de imaturidade e carência emocional, uma manifestação de infantilidade. A melindrice resulta de uma criação deformada, disfuncional. Parece-me cada vez mais comum encontrar pessoas melindrosas, com os nervos à flor da pele. Quando isso acontece entre os crentes, a situação se agrava. Mas é o que acontece - crentes nervosos estão por toda parte.

Enquanto meditava sobre isso, me veio à mente o texto bíblico de Gálatas 4.1-11, onde o apóstolo Paulo chama a atenção das igrejas da Galácia para o viver adulto na fé em Jesus. Ele diz que antes de conhecermos a nova vida em Cristo, éramos como crianças filhas de um pai rico, herdeiras de tudo, mas sem usufruir de nada, por sermos menores. Mas, quando conhecemos a Cristo, nos tornamos filhos adultos com direito a tudo o que pertence ao Pai. Em outras palavras, na família da fé não há lugar para meninice.

A Bíblia chama o começo da vida cristã de novo nascimento (Jo 3.1-7) e nos compara com crianças no início da vida, assim como o é na vida biológica. Somos estimulados a desejar ardentemente, como crianças recém-nascidas, o genuíno leite espiritual, para que, por ele, nos seja dado crescimento para salvação (1Pe 2.2). Devemos crescer na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo (2Pe 3.18); devemos desenvolver a nossa salvação (Fp 2.12), buscando a maturidade e o aperfeiçoamento espiritual (Ef 4.11-16). Esse é o processo do crescimento, ir da infância para a maturidade na vida adulta.

Mas, o que estou enfatizando aqui, é a nossa condição de filhos de Deus com direitos de filhos adultos, herdeiros de todas as coisas do Pai. Mesmo levando em conta o processo do crescimento citado no parágrafo anterior, entramos na vida cristã como filhos adultos e não como bebês desprovidos dos direitos práticos do que o Pai nos dá.

Porém, é aqui que encontramos um dilema. É muito bom saber que entramos na vida cristã com direitos de filhos adultos, mas ninguém pode suprimir o processo do crescimento rumo à maturidade. É aqui que a igreja tem falhado desde o princípio. O apóstolo Paulo disse aos cristãos de Corinto: “Eu, porém, irmãos, não vos pude falar como a espirituais, e sim como a carnais, como a crianças em Cristo” (1Co 3.1). O autor da carta aos Hebreus escreveu: “A esse respeito temos muitas coisas que dizer e difíceis de explicar, porquanto vos tendes tornado tardios em ouvir. Pois, com efeito, quando devíeis ser mestres, atendendo ao tempo decorrido, tendes, novamente, necessidade de alguém que vos ensine, de novo, quais são os princípios elementares dos oráculos de Deus; assim, vos tornastes como necessitados de leite e não de alimento sólido” (Hb 5.11-12). A igreja tem sido lenta no processo da maturidade ao longo dos séculos. Essa lentidão expõe um problema comum na igreja evangélica: o melindre, a facilidade de ficar magoado. A maioria dos problemas dentro das igrejas acontece na área dos relacionamentos. É assim devido a imaturidade emocional entre as pessoas.

Paulo disse: “Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino, pensava como menino; quando cheguei a ser homem, desisti das coisas próprias de menino” (1Co 13.11). Os meninos falam muito, mas não têm profundidade no que dizem. Os meninos são muito sensíveis; tanto se alegram como se entristecem fácil. Eles também pensam muitas coisas que não procedem. Assim são muitos que confessam serem de Jesus. Falam o que não convêm, são sentimentalistas, e têm um pensamento raso acerca dos valores espirituais.

Paulo disse: “... quando cheguei a ser homem, desisti das coisas próprias de menino”. Precisamos amadurecer emocionalmente. Chega de melindres. Eu também já sofri muito desse mal infantilista. Deus tem me dado a graça de conviver com as contrariedades sem perder as estribeiras no galope da vida. Devemos amar a todos sem depender emocionalmente de ninguém e sem sufocar os outros com nossos interesses.

A grande lição que Deus me deu ao deixar a instituição evangélica para caminhar com a comunidade itinerante dos que andam com Jesus na liberdade da fé sem religião, foi que “cada um de nós dará contas de si mesmo a Deus” (Rm 14.12). Cada um é livre para viver como quiser. A igreja não deve pautar a vida de ninguém como tem feito com multidões ao longo dos séculos. Cada um vive conforme sua consciência no evangelho. Quando os discípulos quiseram arrancar o joio, Jesus lhes disse que esperassem pela colheita final (Mt 13). Esse é um tempo de inclusão, não de exclusão.

Antonio Francisco - Cuiabá, 29 de março de 2011 - Voltar para Um novo caminho.

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